sexta-feira, 23 de agosto de 2019

Jardins da Itália


Na literatura ocidental, o jardim italiano ocupa um lugar de relevo nas descrições de viajantes, poetas e artistas que frequentemente idealizaram a diversidade estética e a vivacidade da natureza da Itália a ponto de atribuir-lhe o apelido de “Jardim da Europa”.
O jardim não apenas provoca prazer ao ser hu­mano, estimulando os sentidos e oferecendo experiên­cia tangível da relação homem-natureza, mas também é testemunha da história e da cultura, acompanhando o desenvolvimento do pensamento.
Entretanto, pode-se verificar que no jardim ita­liano algumas características fundantes se mantiveram ao longo dos séculos.
Na antiga Roma, especialmente no período do império, as residências dos ricos eram complementadas com amplos jardins com disposição planimétrica regu­lar e simétrica. Um lago central com fonte de água, era o ponto de convergência de caminhos geometricamen­te dispostos ladeados por bordaduras e arborizados.
Inicialmente dotados de vasos, estátuas e sim­ples bancos de mármore, foram em seguida enriqueci­dos com construções quais pequenos templos galerias e espelhos d’água. Nas residências mais faustosas, como por exemplo na Villa Adriana do imperador Adriano em Tivoli, os equipamentos de lazer eram bastante complexos pois compreendiam entre outros: piscinas, hipódromos e gi­násios, originando assim a transformação dos jardins nos primeiros parques da história.
Na idade média, pela necessidade de defesa dos ataques de toda espécie, os jardins ornamentais eram restritos ao interior dos castelos e dos conventos. 
Nes­tes Hortus conclusos (jardins fechados) - a simplicidade da implantação refletia a austeridade da religião: dois caminhos em ân­gulo reto dividiam o canteiro quadrado central em qua­tro partes iguais, levando ao poço, simbólica fonte de vida. Querem alguns autores que esta disposição seja inspirada no Gênesis, onde está escrito “o rio saiu do Paraíso para regar o jardim, que ficou assim dividido em quatro partes.”  As plantas cultivadas nos claus­tros tinham finalidade utilitária pois eram basicamente frutas e especiarias às quais eram atribuídas qualidades milagrosas.
Aos poucos a austeridade religiosa do claustro foi diluindo-se com a crescente
valorização do prazer que a natureza oferece com os perfumes, as vistas, os frutos e o canto das aves. O jardim se abre às vistas pa­norâmicas, se deita nas encostas desenvolvendo-se na vertical, recebe terraços, escadas, balaústres, “loggia” belvedere. Mantem contudo sua disposição geomé­trica, que na renascença se torna expressão do domínio do homem sobre a natureza e ainda aplicação da recen­te técnica da perspectiva. São usados, para obter estes efeitos, cipreste, louro e murta, dóceis às tesouras do jardineiro e que facilmente adquirem as formas descri­tas nos muitos tratados da época.
O jardim do renascimento é inseparável da resi­dência: jardim e arquitetura são perfeitamente integra­dos complementando-se reciprocamente. Entre as ex­traordinárias realizações do Cinquecento vale lembrar o jardim da Villa d’Este, que o cardeal Ippolito II d’Este  fez cons­truir em Tivoli, próxima à do imperador Adriano. Em fantástica sequência, escadarias, fontes, grutas, estátu­as, perspectivas de e para o edifício central, são marcadas pela vegetação e constituem um dos exemplos mais característicos do “jardim à italiana”. Este, adotado em toda a Europa pelos arquitetos do séc. XVII, servirá de inspiração ao igualmente famoso “jardim à francesa”.
O jardim barroco italiano adquire novas cores novos perfumes através da hibridação e visa reproduzir em síntese todo o conhecimento das descobertas cien­tíficas e geográficas. Surgem os teatros “de vegetação” e colecionismo se estende além das espécies exóticas - por exemplo, as anêmonas e os ananás - também aos animais exóticos para reforçar o poder do príncipe ou do cardeal através do estranhamento provocado nos observadores.
Com o declínio da Itália no panorama político europeu, é inevitável a decadência do jardim que emo­ciona apenas alguns autores românticos pelo aspecto pitoresco da luta da natureza selvagem sobre a antiga ordem imposta pelos jardineiros.
Recentemente, a cidade de Modena instituiu uma mos­tra anual de jardins, onde, através das propostas de arquitetos e paisagistas, pode-se verificar a permanên­cia dos elementos característicos mantidos ao logo da história: perspectivas, desníveis, água e elementos escultóricos compõem o jogo sempre variado do jar­dim italiano. 

Palestra proferida em 22/set/1999 por:

Sra. Maria Luiza Piermartiri Valenti -   Arquiteta
e Sr. Maximiliano Piermartiri - Eng. Agrônomo.